Uma vistoria do Ministério Público Federal (MPF) em Roraima, realizada no último dia 6, confirmou a presença de invasores na Terra Indígena Pirititi, localizada em Rorainópolis, no sul de Roraima, divisa com o Amazonas. O território é habitado por indígenas em isolamento voluntário, mas não é demarcado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Durante uma fiscalização, os procuradores da República Alisson Marugal e Matheus de Andrade Bueno identificaram a atuação de posseiros e grileiros nos limites da área interditada pela União, avançando na ocupação territorial para o interior da TI, segundo nota do MPF. “A denúncia é de que as invasões seriam para retirada ilegal de madeira e grilagem de terras públicas”, informou o órgão.
Segundo o MPF, as constatações devem fundamentar o requerimento de medidas judiciais para a retirada dos invasores, além da responsabilização criminal pelos atos cometidos. Também permitirão que o MPF prossiga nas cobranças junto aos órgãos ambientais para o cancelamento de registros no Cadastro Ambiental Rural (CAR), sobrepostos à TI Pirititi. O órgão também pede a anulação de licenças e autorizações de desmatamento que atingem o território indígena.
“A presença do MPF na região reafirma o compromisso do órgão de garantir que os Pirititi possam habitar em paz suas terras, usufruir tranquilamente dos recursos necessários ao seu bem-estar e viver livremente seus costumes e tradições”, afirmou o procurador Alisson Marugal, titular do Ofício de Defesa dos Direitos Indígenas.
Nos últimos dez anos, desde que a Funai confirmou a existência do povo Pirititi, a única interdição para assegurar a área tem sido portarias de interdição que precisam ser permanentemente renovadas. No governo Bolsonaro, as portarias eram renovadas por tempo curto, como acontecia com outros territórios onde há grupos de indígenas em isolamento, como é o caso da TI Piripkura, em Rondônia, e a TI Ituna Itatá, no Pará. Em novembro de 2022, um acordo entre o MPF e a Funai garantiu a interdição por tempo indeterminado e a Funai assegurou que fará a demarcação até 2025. Até lá, contudo, conforme constatou a inspeção do MPF, há risco de as invasões continuarem ocorrendo.
A área já estava interditada administrativamente desde 2012, após a primeira constatação da existência dos indígenas isolados. Esse acordo proíbe o ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da Funai no local.
Com o acordo, as portarias de interdição passam a ter prazo de vigência indeterminado e só deixarão de existir quando os estudos para a demarcação da TI forem concluídos e o território for homologado pela União.
Degradação ambiental
- Vista aérea da Terra indígena Pirititi, em Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
- Aldeia na Terra Indígena Pirititi em 30/06//2018, território invadido (Foto: Ascom Ibama)
- Desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
- Desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
- Desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
- Ibama combate desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi (RR) Foto: Felipe Werneck/Ibama
- Apreensão de madeira no dia 30/04/2018 (Foto: Felipe Werneck/Ibama)
- Desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
- Desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima (Foto: Felipe Werneck/Ibama/2018)
Há anos a presença de invasores causa desmatamento na TI Pirititi. Em 2018, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) apreendeu 7.387 toras (o equivalente a 15.663 metros cúbicos) de madeira extraída ilegalmente do território. Foi a maior apreensão de madeira ilegal já feita em Roraima.
O Ibama declarou, na época, que a derrubada de árvores degradou um total de 1.372 hectares de floresta dentro da TI Pirititi, o equivalente a mais de 1.300 campos de futebol. Os invasores também abriram ramais e estradas para retirada das toras da floresta.
Segundo monitoramento feito em 2021, por meio do Boletim Sirad-Isolados, do Instituto Socioambiental (ISA), a grilagem avançou na TI Pirititi e ocupa 47,8% do território. O estudo mostra que a TI Piririti é uma das mais vulneráveis ao desmatamento, com forte presença de madeireiros.
Em maio de 2022, o MPF entrou na Justiça Federal com um pedido de tutela provisória de urgência (equivalente a uma liminar) para garantir a proteção da TI, devido às graves ameaças de invasão e degradação por grileiros, colonos e madeireiros que vivem nos limites da área.
Titular do Ofício de Meio Ambiente, o procurador Matheus de Andrade Bueno reforça a importância da proteção ambiental para a garantia da integridade e segurança dos isolados da TI Pirititi. “A garantia dos direitos dos povos da floresta pressupõe a proteção do meio ambiente e do respectivo território. Essa necessidade é ainda mais acentuada no caso dos Pirititi. Em razão do isolamento voluntário, a etnia não conta com mobilização no espaço público que provoque a atuação do MPF, o que revela estado de maior vulnerabilidade”, disse.
A TI Pirititi abriga indígenas em isolamento que foram identificados pela Funai durante um sobrevoo, em 2011. Antes, acreditava-se que eles viviam dentro dos limites do território da TI Waimiri-Atroari, localizada entre o Amazonas e Roraima. Conforme o decreto de restrição da área, a terra indígena tem 43.404 hectares. O território está com acesso interditado, ou seja, é proibida a entrada de qualquer pessoa e sua exploração econômica. Não há informações sobre o número de indígenas que vivem na área.
Apesar da identificação, a Funai não realizou o procedimento de demarcação do território Pirititi. Diante da lentidão do processo, no ano passado o MPF ingressou com uma ação civil pública para obrigar a Funai e a União a terminar os relatórios e formalizar a criação da TI. O pedido do MPF estabelece o prazo de quatro anos para o fim do processo administrativo.
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