Aprovada em dois turnos pelo Senado, na quinta-feira passada, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criminaliza a posse e o porte de qualquer quantidade de droga é criticada por especialistas, que a apontam como inconstitucional.
De autoria do presidente da casa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a PEC foi aprovada com 53 votos favoráveis e nove contrários no primeiro turno e 52 favoráveis e nove contrários no segundo turno. Os três senadores do Amazonas, Omar Aziz (PSD), Eduardo Braga (MDB) e Plínio Valério (PSDB) votaram a favor da matéria.https://www.smartadserver.com/ac?siteid=482434&pgid=1518426&fmtid=38614&tgt=foo%3Dbar&tag=sas_38614&out=amp-hb&isasync=1&pgDomain=https%3A%2F%2Fwww.acritica.com%2Fpolicia%2Fpec-das-drogas-fere-a-constituic-o-federal-afirmam-especialistas-1.337533&tmstp=0-18426168711585989&__amp_source_origin=https%3A%2F%2Fwww.acritica.com
Segundo a advogada Nauzila Campos, a aprovação da PEC ocorre em meio a uma queda de braço entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), “porque ainda tramita no Supremo a ação de inconstitucionalidade a respeito de um artigo da Lei de Drogas que determina que ainda seja um ilícito penal o porte de drogas para consumo próprio”.
A ação, que está parada na Corte após um pedido de vistas do ministro Dias Toffoli, começou a ser julgada em 2015. Inicialmente, os ministros defendiam a possibilidade de descriminalização do porte de qualquer tipo de droga para uso pessoal, mas agora a Corte caminha para restringir a decisão somente para o porte de maconha. Embora a Lei de Drogas não preveja prisão, não há um critério objetivo para separar quem é usuário e quem é traficante.
Nauzila Campos afirmou que a PEC já nasce inconstitucional porque até mesmo o julgamento no STF discute a descriminalização como uma questão de saúde pública.“Os adictos, as pessoas com dependência química, podem ser pegos pela polícia com porte de drogas. Na vigência eventual desse projeto de emenda constitucional, essas pessoas podem ser presas por ter uma doença. Nem todo mundo que é preso com drogas é traficante. É muito importante para a política de drogas criada no Brasil há décadas para se garantir saúde pública, e não sair somente prendendo pessoas, é muito importante que se diferencie a pessoa que vive do comércio ilegal de drogas, que a Constituição trata como crime hediondo, e também diferenciar a pessoa que é dependente química”, disse.
A advogada elencou como uma das inconstitucionalidades da proposta a violação do direito à vida privada e à intimidade, mas o principal da PEC é a subjetividade da polícia em definir quem é usuário ou traficante.
“Não é novidade esse debate em relação a termos uma polícia extremamente racista. A gente vê isso há décadas em relação ao nosso sistema carcerário, que é majoritariamente composto por pessoas de baixa renda e pessoas pretas. Essas pessoas, normalmente, são as que infelizmente sofrem de maneira mais violenta esse tratamento policial. E já que não existe uma delimitação a respeito da quantidade de drogas que define quem é traficante e quem é só usuário, isso fica subjetivo para os agentes policiais. Então eles escolhem prender aquelas pessoas de classe mais baixa e pessoas negras”, destacou.
STF busca critérios
Conforme os votos proferidos no STF até o momento, prevalece a tese do ministro Alexandre de Moraes (5 votos a 3), que fixa uma quantidade de maconha para caracterizar o uso pessoal: entre 25 a 60 gramas ou seis plantas fêmeas de cannabis. O caso que motivou o julgamento envolveu a prisão de um homem por tráfico de drogas. Ele foi detido com três gramas de maconha.
Deleado discorda da medida
Delegado da Polícia Civil, João Tayah se colocou contra a PEC com o argumento de que a medida está contra tudo o que especialistas em segurança pública afirmam sobre o tema.“A solução para os problemas relacionados às drogas não está na criminalização e na proibição. Nós vemos países desenvolvidos do mundo, como alguns estados nos Estados Unidos, Uruguai, Espanha, Portugal, Holanda, que já descriminalizaram o uso da maconha. Existem estabelecimentos para comercialização lícita da maconha em qualquer esquina desses países, possibilitando que pessoas honestas possam desenvolver o comércio e evitando que esse dinheiro vá parar na mão dos delinquentes e das facções criminosas. Hoje a criminalização das drogas é a principal fonte de renda das facções criminosas no Brasil”, disse.
O delegado também afirmou que a Constituição Federal não é lugar para que sejam instaladas tipificações penais, apenas de direitos e garantias fundamentais dos cidadãos brasileiros. Ele também relembrou que o porte de drogas é crime por meio de lei há mais de vinte anos e que não há razão jurídica ou social que justifique a transferência de um tipo penal para a Constituição.
“Parece-me que o legislativo federal só está implementando isso para demonstrar algum tipo de força numa queda de braço com o STF, mas a Constituição é um instituto normativo muito sério para você ficar utilizando como um instrumento de disputa entre os poderes”, concluiu.